Foto: Allan Mas
A pandemia de Covid-19 tem trazido grandes impactos não só no dia a dia, mas também no bem-estar físico e emocional de muitas pessoas, causados principalmente pelo luto. Quando o luto está relacionado à perda de um familiar ou alguém muito próximo pela Covid-19, em conjunto com outros fatores, há a impossibilidade de se despedir do ente querido e a dificuldade financeira, por isso a fragilidade emocional para lidar com a situação se torna um processo ainda mais sensível. O apoio comunitário tem ajudado muitas famílias e crianças que sofrem neste momento. O luto requer tempo e adultos e crianças precisam de compreensão, paciência e muito apoio. As atenções, a ajuda com as atividades do dia a dia e o suporte podem tornar o processo de luto um pouco mais leve.
Para falar mais sobre este assunto convidamos a Dra. Mirella Carletto Silva, Psicóloga Clínica, Terapeuta de Perdas e Lutos Infantojuvenil e de Adultos, de Campo Largo, Paraná, e Maria das Graças Silva Gervásio, Assistente Social da Equipe Técnica da Coordenação Nacional da Pastoral da Criança.
Doutora Mirella Carletto Silva
Entrevista com a Doutora Mirella Carletto Silva, Psicóloga Clínica, Terapeuta de Perdas e Lutos Infantojuvenil e de Adultos, de Campo Largo, Paraná.
Quais fases ocorrem no luto infantil. Como a criança manifesta esta dor e como a família e comunidade podem ajudá-la?
O luto é um processo normal, esperado, único e singular. Não é uma doença, não se é falado em cura ou superação, não existe um tempo determinado para sua duração, pois ele envolve aprendizado, ressignificação, adaptar-se a uma nova vida. Não existem fases, pois cada enlutado vive sua perda à sua própria maneira, sem regras pré-definidas. Em relação à forma que as crianças expressam o luto, segundo os conhecimentos de Piaget, sua compreensão ocorre de acordo com seu estágio de desenvolvimento cognitivo. É importante observar mudanças no comportamento da criança, como comportamentos diferentes, medos, dificuldades para assimilar novas rotinas, tristeza e isolamento e, após ser percebido, procurar atendimento psicológico, que pode ser realizado nas redes públicas, através do CAPS infantil, CREAS ou serviço de Clínica- Escola, disponível nas Faculdades de Psicologia.
Programa de rádio Viva a Vida
1550 - 07/06/2021 - Crianças em luto em tempo de pandemia
Esta entrevista é parte do Programa de Rádio Viva a Vida da Pastoral da Criança.
Ouça o programa de 15 minutos na íntegra
Na sua opinião, como dar a notícia e conversar com as crianças sobre isso?
Ao comunicar uma notícia de morte para uma criança é necessário não omitir os fatos e não usar metáforas como “virou uma estrelinha” e, sim, permitir que possam sentir e expressar sua dor, oferecendo espaço para que possam conversar, e que seus sentimentos em relação a morte sejam ouvidos e validados sempre. Outra informação muito importante é em relação a criança participar de enterros e velórios, que sempre seja questionado o seu desejo em participar ou não e o respeitar. O fato da criança vivenciar estes momentos, caso seja de seu interesse, não irá causar nenhum trauma.
Maria das Graças Silva Gervásio
Entrevista com Maria das Graças Silva Gervásio, assistente social da equipe técnica da Coordenação Nacional da Pastoral da Criança.
Muitas vítimas da Covid-19 eram arrimos de família. Muitas delas deixaram crianças e outros dependentes, órfãos de apoio. Como o amparo e a solidariedade podem ajudar
É muito importante as famílias saberem que não estão sozinhas. Que nesse momento que estão enfrentando tantas perdas podem contar com o apoio de outras pessoas da comunidade. Os próprios vizinhos, os líderes da Pastoral da Criança, outros agentes da Igreja, da Associação de Moradores, todas essas pessoas podem formar uma rede de solidariedade para esta família. Esse apoio pode acontecer das mais diferentes formas, desde um apoio emocional, buscando uma saúde psicológica; até uma ajuda financeira
com alimentos, por exemplo. Outra coisa que não podemos perder de vista é que nesses momentos os direitos da criança que perdeu a mãe ou o pai precisam ser assegurados. E essa rede de solidariedade e de proteção precisa se consolidar para atender as necessidades da criança.
Qual é a importância das redes de apoio social entre as famílias para fortalecê-las no ato de cuidar das crianças em luto
Essa rede de apoio social que pode acontecer entre as famílias precisa ser, de forma mais ampla, fortalecida. A família saber que pode contar com uma rede de apoio já alivia um pouco o seu sofrimento. O cuidado com as crianças, mesmo sendo uma responsabilidade da família, também é de toda a comunidade. As crianças precisam se sentir seguras de que outra pessoa irá cuidar delas. Assim, também, poderão viver o seu luto, pois, mesmo não sendo igual ao das pessoas adultas, elas têm os seus próprios sentimentos e também podem demonstrar tristeza e sofrimento diante dessa situação de morte, de perda de uma pessoa querida.
Que outras orientações, a senhora teria para apoiar crianças e famílias neste momento difícil?
Sabemos que no Brasil a questão da desigualdade social sempre esteve presente. Com a pandemia essa desigualdade só se manifestou de forma mais escancarada. Realmente, muitas famílias contam com apenas uma só pessoa responsável pela subsistência de toda a família. Se acontecer de faltar essa pessoa por causa da Covid-19, essa família se sente desamparada. A Pastoral da Criança, muitas vezes, é quem está mais presente junto à família. Assim, pode recorrer e mobilizar outras frentes na comunidade, tais como a ação social da paróquia, órgãos da prefeitura, através dos centros de assistência social, para ajudar essa família. É importante sempre frisar que o líder não deve pensar que precisa fazer tudo, resolver tudo, mas, sim, que é uma grande força de mobilização na comunidade para ajudar essas famílias.
Leia a entrevista na íntegra: 1550 - Crianças em luto em tempo de pandemia (.PDF)
Dra. Zilda
“Assim, unidos, somando esforços, continuamos a fortalecer essa rede de solidariedade humana, a serviço da vida e da esperança”
Papa Francisco
"De uma crise, sai-se melhor ou pior. Temos que escolher. E a solidariedade é precisamente o caminho para sair melhores da crise”