O Movimento Humanos Direitos (Mhud) e o Grupo de Pesquisa Trabalho Escravo Contemporâneo do Núcleo de Estudo de Políticas Públicas em Direitos Humanos (Nepp-DH) da UFRJ realizaram, dia último dia 21, a entrega do Prêmio João Canuto 2010. O prêmio tem por objetivo dar visibilidade a empreendedores sociais e organizações dedicadas à defesa dos direitos humanos nas mais variadas esferas.
Esta edição do Prêmio teve como o eixo central o trabalho escravo, ainda presente principalmente em regiões rurais do país. Não se trata mais da compra e venda de pessoas como mercadorias, como era feito, no Brasil, até o final do século XIX. Nos dias de hoje, o trabalho escravo se caracteriza por aspectos como a obrigação de atingir metas excessivas, jornadas exaustivas, eternos endividamentos e outras formas que permitem a máxima exploração da força de trabalho de um indivíduo.
Estavam presentes à cerimônia, entre outras autoridades, o ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, o deputado estadual Marcelo Freixo do PSOL, o deputado federal Alexandre Molon do PT, além de integrantes da comunidade artística, entre as quais as atrizes Camila Pitanga e Priscila Camargo, apresentadoras do evento.
Vannuchi abriu a cerimônia abordando questões relativas à terceira edição do Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH3) e sobre a reação da Imprensa, Igreja e demais setores da sociedadade. “É preciso estar muito atento aos rumos dessa discussão, pois, no Brasil, vivemos uma triste conjuntura em que candidatos que estampam na camisa ‘direitos humanos é o excremento da bandidagem’ são eleitos com largo apoio popular”, alertou.
O primeiro homenageado da noite foi o jornalista Leonardo Sakamoto, que também fez referência ao PNDH3. Sakamoto, de 33 anos, é reconhecido internacionalmente pelo seu trabalho e atuação militante em questões relativas aos direitos humanos, o que já lhe rendeu uma série de prêmios. O jornalista criticou as posturas das Forças Armadas e da Igreja Católica frente ao Plano em questões referentes à revisão de crimes no período de ditadura militar e ao aborto, respectivamente.
Profissionais de diversos setores foram lembrados, como o pescador Alexandre Anderson, premiado pela sua ação em busca da garantia de direitos da categoria na Baía de Guanabara. O Instituto Materno-Juvenil de Pernambuco (Imip) recebeu o reconhecimento pela sua ação pioneira em políticas de Saúde e nos ótimos resultados alcançados naquele estado. O missionário francês Dom Xavier Gilles de Maupeau d’Ableiges foi lembrado pela atuação de destaque na Conferência Nacional dos Bispos do Brasil na Região Nordeste V (Maranhão), em que exerceu a função de vice-presidente, entre 1999 e 2002, e de 2003 a 2005; e presidente, de 2005 a 2007, e de 2007 a 2009.
O rapper Alex Pereira Barbosa, mais conhecido como MV Bill, produtor, ao lado de Celso Athayde, do documentário Falcão – Meninos do Tráfico, recebeu o prêmio em função de sua intensa atuação nas favelas do Rio de Janeiro. A luta pela igualdade de direitos e pela devida demarcação e respeito das aldeias e da cultura indígenas teve reconhecimento através do prêmio oferecido ao Conselho Indigenista Missionário (CIMI). O grupo lidera um movimento contra a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no município de Altamira, no Pará.
O Comitê Popular de Combate e Erradicação do Trabalho Escravo nas Regiões Norte e Noroeste Fluminense, composto por integrantes do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do Trabalho e Emprego, entre outras 18 entidades, recebeu o Prêmio João Canuto pela sua atuação naquela região, onde este modo de exploração é sobremaneira empregado nas usinas de açúcar e álcool. O grupo levou ao palco um número expressivo de seus integrantes, que, ao receberem a homenagem, ofereceram uma cesta de frutas, legumes e verduras produzidos por famílias assentadas.
Teve destaque também o Movimento 11 de Dezembro, grupo criado em novembro de 1999 pelos familiares das vítimas da explosão de uma fábrica de artifícios, no município de Santo Antônio de Jesus, na região do Recôncavo Baiano. Somente 12 anos após o acidente, no dia 20 de outubro deste ano, cinco dos oito acusados pela morte das 64 pessoas foram condenados pela 2ª Vara do Tribunal de Júri, em Salvador. Emocionada, a representante do movimento declarou que “ainda não tinha caído a ficha de que finalmente a justiça foi feita e que e se pode ver algo além da impunidade neste país”.
A última premiação da noite foi uma homenagem à memória de Zilda Arns. Médica especializada em Saúde Pública, Zilda direcionou sua vida à saúde infantil e ao trabalho social. Ativista incansável, esteve em diferentes partes do mundo como Indonésia, Angola, Estados Unidos e quase toda a Europa, militando por uma saúde melhor e condições mais dignas de vida aos mais pobres. A missionária estava no Haiti, onde em janeiro de 2010, aos 75 anos, foi uma das vítimas do terremoto que matou milhares de pessoas. No momento de sua morte, Zilda proferia uma palestra sobre o combate à desnutrição.
O evento foi encerrado com a voz e o violão de Geraldo Azevedo que, acompanhado da atriz Letícia Sabatella, interpretou alguns de seus sucessos como Dia Branco, Bicho de sete cabeças e Caravana.
Universidade Federal do Rio Janeiro Online- 29/10/2010