"Parte da discriminação poderia ser resolvida com maior clareza e segurança sobre o assunto", afirma especialista.
Veja entrevista de Clovis Boufleur para a Agência Notisa, sobre a situação da hanseniase no Brasil.
Segundo o Ministério da Saúde, houve 30.928 novos casos detectados como hanseníase no país em 2011, sendo que 2.192 ocorreram em menores de 15 anos. Este índice é considerado alto para o grupo de crianças e adolescentes. Em entrevista exclusiva à Agência Notisa, Clovis Boufleur, gestor de Relações Institucionais da Pastoral da Criança Curitiba (PR), explica como é a ação dessa instituição em relação à hanseníase. A entrevista foi realizada durante o 1st Internacional Symposium Hansen´s Diseasemand Human Rights, evento promovido pela ONU e realizado semana passada no Rio de Janeiro.
Agência Notisa – Como é realizado o trabalho da Pastoral da Criança no combate à hanseníase?
Clovis Boufleur – Estamos envolvidos com a eliminação da hanseníase há mais de dez anos, pois, em certos lugares, 10% dos casos de doença são em menores de 15 anos. Como a pastoral atua em lugares pobres, onde a incidência é alta, e com crianças de seis anos de idade, acreditamos que a nossa atuação seria essencial para o sucesso da operação de eliminação da doença.
Na época em que a doutora Zilda Arns Neumann coordenava a pastoral da criança, foi proposto que, junto com as atividades governamentais em curso e com a sociedade cível, desenvolvêssemos um projeto de formação de lideranças voluntárias nos estados prioritários (Norte, Nordeste e Centro-Oeste) e em alguns municípios com índices acima de dez casos por 100 mil habitantes. Nós formamos as lideranças com um material educativo para que elas possam entender como a hanseníase se manifesta e explicar para as famílias que são visitadas a cada mês. É uma ação voltada para a suspeita da doença e orientação para buscar o serviço de saúde imediatamente e mais próximo para confirmar a doença ou não. É uma ação de informação e comunicação, temos hoje 16 mil voluntários treinados e habilitados para identificarem a doença e orientarem as pessoas.
Agência Notisa – Qual a expectativa da Pastoral da Criança sobre o Apelo Global 2012 pelo fim do estigma e da discriminação contra as pessoas atingidas pela hanseníase e suas famílias e os direitos humanos pregados pela ONU?
Clovis Boufleur – Nós consideramos que é necessário melhorar questões no Brasil não só a respeito da hanseníase, mas muitas outras. Compreender que as pessoas precisam ser olhadas como um todo e não como uma pessoa com esta ou aquela deficiência ou limitação é, portanto, uma mudança cultural. A expectativa é que isso vai melhorar. A nossa visão de convivência com as pessoas é que existem diferenças relacionadas tanto a pensamentos quanto a comportamentos, e nós temos que conviver uns com os outros e não criar rótulos que afastam as pessoas. Esperamos que essa amenização com políticas como esta, possa proporcionar melhorias e que possa ainda ser estendida para outros problemas sociais que o país possui. Nossa expectativa é muito boa, de esperança. Precisamos divulgar cada vez mais a extinção desses e de outros estigmas que existem na sociedade.
Agência Notisa – Como se estabelece a relação entre Pastoral da Criança, governo estadual e federal contra a hanseníase?
Clovis Boufleur – Nós participamos de instâncias de decisões políticas, tanto nos estados como em nível federal, para que sejam ofertados, primeiramente um acesso de qualidade ao serviço. Em seguida, defendemos um diagnóstico preciso da doença e a oferta do medicamento sem interrupção, pois, muitas vezes, as pessoas fazem a sua parte, mas faltam medicamentos para a finalização do ciclo. E por último, defendemos o tratamento das sequelas e consequências da doença. São, portanto, quatro aspectos que procuramos influenciar nos diálogos com os governos.
Agência Notisa – Em sua opinião, como se resolve a questão da discriminação contra pessoas atingidas pela hanseníase?
Clovis Boufleur – Primeiro, é preciso se curar da doença. Precisa ser reforçado que uma vez iniciado o tratamento, a doença não se propaga mais. Parte da discriminação poderia ser resolvida com maior clareza e segurança sobre o assunto. A Pastoral da Criança entende que também é necessária uma maior participação das instâncias de comunicação, das mídias, que dão pouco espaço para esse tipo de informação. Informações corretas vão ajudar na mobilização de mais pessoas, pois o indivíduo às vezes até sabe que precisa procurar o médico, mas fica com o receio de não ser compreendido e de ser discriminado. Esses receios impedem o avanço da eliminação da hanseníase.
Fonte: Agência Notisa (science journalism – jornalismo científico)