"Há um só Deus que, por sua Palavra e Sabedoria, criou e harmonizou todas as coisas. Sua Palavra é nosso Senhor Jesus Cristo, que nos últimos tempos se fez homem entre a humanidade, para unir o fim ao princípio, isto é, o ser humano a Deus”.
(Tratado contra as heresias, de Irineu de Lion, bispo do séc. II d.C)
Este é um sermão da Liturgia das Horas do Advento, muito apropriado para o início de um novo ciclo, já que começa um ano novo em nosso calendário cristão. Tempo de preparação, revisão e espera ativa e militante de um novo (velho) começo. Sempre com desafios e possibilidades para o caminho, a jornada para a qual todos nós nascemos e fomos batizados.
Em dezembro, no tempo do Advento, nos preparamos para a festa da Encarnação de Deus. Jesus é a Palavra de Deus feito gente. Como diz Santo Irineu, para que a religião seja plena, Jesus é a ligação fundamental entre a humanidade e a divindade, “nada pode nos separar do amor de Deus” (1Cor 8). Nem mesmo o pecado. O pecado não tem mais poder por causa da Ressurreição e do nosso Batismo. Nascemos pessoa nova para uma nova vida (Romanos 6). O batismo destruiu o pecado no homem, mas enquanto seu corpo não “revestir a imortalidade” (1Cor 15,54), o pecado pode encontrar neste corpo “mortal”, sede da concupiscência, o meio de ainda reinar. Mas, mesmo tendo pecado, a pessoa tem a possibilidade de ser redimida em virtude da Ressurreição de Cristo.
A encarnação de Deus é o testemunho de que a vida é fundamental e deve ser defendida. Afinal, somos imagem e semelhança de Deus. Qualquer violência contra o ser humano é uma violência contra a natureza divina da qual compartilhamos em Jesus. Ofender a humanidade é ofender a Deus. Neste advento, somos convidados a orar e trabalhar para que os direitos humanos e do planeta estejam na agenda de governos, empresas, igrejas, religiões e pessoas. O menino que nos guiará (cf. a profecia de Isaías) nos convoca a segui-lo para que todas as pessoas tenham vida e que a dignidade seja o prato do dia a dia.
Somos chamados a imitar e seguir a ternura, o compromisso e a sabedoria que os pastores, animais e os médicos estrangeiros (magos eram médicos naquela época) expressaram quando se deram conta da grande novidade que era o nascimento daquele menino. O menino e sua família manifestavam a grande esperança há tanto tempo cultivada por boa parte do povo, de que a liberdade estava chegando, de que um novo mundo (jeito de viver) é possível e vai acontecer. Acreditar no impossível, desafiar o desespero e a opressão foram os resultados daquele evento único: Deus, por amor incondicional, mesmo sabendo de nossos pecados e iniquidades naturais, encarnou-se. Com afinco e determinação, Ele nos anima na jornada até hoje.
Como eu sempre lembro, a Pastoral da Criança faz desse evento único, a encarnação de Deus, uma experiência cotidiana na sua missão de cuidar e transformar o mundo, não se conformando com este que está aí. Por obra do Espírito Santo, segue na jornada do cuidado e da defesa da vida dos mais vulneráveis. E faz isso com um espírito de dedicação, abertura e carinho, que faz o povo reconhecer que Jesus veio visitar a humanidade de novo, a cada dia e de um jeito novo. Cada visita que alguém faz é a visita de Deus, é o Sol que visita o povo e traz libertação. Acreditando no impossível, fazemos a diferença e testemunhamos que o Reino de Deus chegou e está no meio de nós (Mc 1,1-15).
É Natal de Jesus, festa de alegria, de esperança e luz. Assim seguimos dançando e cantando, até o fim dos tempos, na militância, na oração e no cuidado. Que Deus nos dê a graça de seguirmos esse caminho, cada vez mais juntos e cada vez mais unidos.
Paulo Ueti
Assessor da Pastoral da Criança