Nosso planeta está clamando por socorro, de dor e sofrimento. Nossas irmãs e irmãos mais vulneráveis estão gritando por ajuda e por atenção. Nossos ouvidos estão atentos? Estamos escutando?

       O Credo de Israel começa com esta palavra/atitude: “Escutar”. E escutar, na tradição bíblica e espiritual, significa estar atentos/as para a realidade, para os acontecimentos, para o mundo e viver concretamente. É a atitude contemplativa em primeiro lugar que vai aos poucos modificando nosso jeito de olhar e nossas teorias sobre o que observamos e experimentamos e, portanto, vai modificando nosso jeito de viver também.

       Assim começa o pedido de Deus para que façamos o que Ele mesmo fez: “Eu vi, eu vi, a miséria do meu povo que está no Egito, ouvi o seu clamor por causa dos seus opressores e desci para libertá-los” (Ex 3,1-10).  É assim que Deus define sua ação no mundo: Estando presente e colaborando com a gente no cuidado com sua criação. Nas religiões sempre procuramos escutar a Deus, o que significa, então, escutar o mundo, visto que é no mundo que a manifestação de Deus acontece e pode ser percebida. Contemplar a Deus nos leva a contemplar as alegrias e os sofrimentos do mundo. Significa escutar uns aos outros, umas às outras, numa atitude de respeito e de disponibilidade à relação. Assim Ele o quis. Não quis fazer só, mas toma iniciativa quando alguém sofre ou é oprimido. Nestes tempos de pós Conferência Mundial sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, e pensando em nosso trabalho junto às comunidades e às pessoas que mais necessitam, precisamos perguntar qual é a nossa vocação.

 

       Vocação é um chamado. Não está relacionado com habilidade. Infelizmente, virou meio comum pensar que vocação quer dizer que alguém “leva jeito”, sabe fazer ou tem habilidade natural para alguma coisa. Não! Não! E não!

       Vocação é chamado. Deus nos chama para algo, para uma ação de cuidado com sua criação, de transformação pessoal para sermos pessoas melhores e mais justas e íntegras. Você foi chamado para que? O que você faz é por um chamado de Deus ou por razões pessoais somente? “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.” (Mt 7,21) Os Evangelhos e muitas tradições espirituais dos primeiros Padres da Igreja estão cheios destes alertas para que estejamos atentos e atentas para a escuta e prática da Palavra de Deus. Dois exemplos a seguir. Maria escutava e guardava tudo no seu coração (Lc 2,19), ou seja, ela conseguiu expressar na vida cotidiana dela, com seu corpo, suas atitudes, a palavra de Deus dita e escutada. Maria, irmã de Marta (Lc 10,38-42),  escolheu a melhor parte, que foi a de receber Jesus e dar atenção a ele. Ela foi capaz de desorganizar a vida cotidiana, desinstalou-se, deixou de fazer o que costumeiramente fazia, deixou a casa desarrumada para ser hospitaleira e sentar-se aos pés de Jesus para escutá-lo. Essa mulher torna-se modelo de espiritualidade e de seguimento. Quantas vezes somos capazes de imitá-la? Quantas vezes a escuta da palavra de Deus (Jesus) incomodou nossa rotina de vida, nossas verdades arrogantes, nossas certezas violentas? Vamos pensar nisso nesse mês de agosto, em que oramos, para que possamos estar atentas/os para ouvir o que “o Espírito diz às Igrejas” (Ap 2,7). E atentas/os para atender esse chamado de colocarmo-nos à disposição, para “cuidar e cultivar o jardim” (Gn 2). Que Deus nos dê a graça de continuarmos nosso trabalho de escuta e cuidado, de cura e reconciliação.

Paulo Ueti

Assessor da Pastoral da Criança