Por muitos anos acreditávamos que a gravidez protegia as mulheres do adoecimento de transtornos mentais, a mulher com seu bebê não adoeceria, pois estava no ápice de sua felicidade e realização, e não é que isso não seja algo incrível e maravilhoso. Mas o ciclo gravídico-puerperal classifica por si só fatores de risco desencadeantes para transtornos mentais.
Na França anos atrás se falava da Depressão sorridente, as mulheres que ganhavam bebês sempre estavam sorrindo, mas este sorriso não expressava seus sentimentos, e por vezes, o que não se esperava socialmente e culturalmente para este período eram reprimidos. Anos se passaram desde então, mas ainda hoje mulheres vivenciam esta síndrome, semanalmente recebo em meu consultório mulheres em sofrimento que relatam sobre sua culpa em relação a via de nascimento do bebê, por não terem amamentado, pelo filho que tem seletividade alimentar, por não serem a mãe que idealizaram e isso desencadeia angustia e complicações no vínculo mãe e bebê. Em Nossa sociedade a maternidade é romantizada, o que não abre brechas para compartilhar as inseguranças inerentes deste momento.
É comum mulheres recém mães relatarem que no pós parto se sentiram invisibilizadas e solitárias com a atenção e cuidados voltados ao bebê, a perda de sua identidade e individualidade. Período que remete a construção de uma nova identidade, e elaboração do luto da mulher que já não se é mais, momento que pode gerar sentimentos contraditórios relacionados a sua maternidade (amor, ódio, alivio, medo, solidão, satisfação, decepção), e despertar o sentimento de culpa por não dar conta dos cuidados do bebê e o medo de nunca mais se encontrar, este período de tantas adaptações precisa de acolhimento, afeto e cuidado.
Naturalizamos tanto o cansaço materno, que quando mulheres relatam estar cansadas, exaustas, sem paciência ou que em alguns momentos não estão sabendo lidar com a maternidade, já queremos de imediato, ampara-las com falas do tipo vai passar, é assim mesmo, isso é só uma fase, e isto pode nos levar a questionamentos, porque as vezes é tão difícil ouvir uma mãe que se queixa? De fato passa, sim, de fato é fase, pode ser, mas com qual qualidade está passando? Pode ser uma necessidade de falar de si e do momento de solidão, da falta de espaço, das mudanças. E também pode ser depressão e depressão tem tratamento, e é possível aos poucos retomar a uma vida com sentido e qualidade.
Os dados apontam que ser mulher já é um fator de risco para transtornos mentais, uma a cada cinco mulheres apresentam transtornos mentais comuns, e uma a cada quatro mulheres apresentem depressão pós parto, esse número ainda não demonstra toda a realidade, pois temos subnotificações dos profissionais da área da saúde pelo desconhecimento ou falta de condições técnicas para rastrear a Depressão Pós Parto e mulheres que não relatam o que sentem por conta do medo de serem julgadas como má mães ou de pensarem que não amam seus filhos. Precisamos considerar que muitas mulheres podem gestar estando acometidas com transtornos depressivo, de ansiedade, de humor, alimentar entre outros, e que muitas vezes não estão em tratamento.
A saúde mental materna vem sendo alvo de muitas discussões que enfatizam a importância de políticas públicas que voltem o olhar para uma das fases mais importantes na vida da mulher que remete a mudanças e reorganizações de papeis. Daí a importância de não apenas romantizarmos a gestação e puerpério, mas sim abrir discussões e apontamentos para este período e tudo o que de fato envolve.
Após o nascimento do bebê é natural que até 90% das mulheres adentrem em um quadro esperado que é o baby blues, também conhecido como tristeza puerperal, momento caracterizado como instabilidade emocional, acompanhado com choro sem motivo, cansaço, irritabilidade, tristeza súbita, introversão, e geralmente desaparece até o fim do primeiro mês.
Quando esses sintomas permanecem e se intensificam devemos estar atentos, pois a Depressão Pós Parto (DPP), não afeta apenas a saúde da mulher, mas também o desenvolvimento do bebê. A DPP é limitante e em alguns casos mais intensos pode incapacitar a mulher com os cuidados do bebê, além de ser um adoecimento tão sofrido e doloroso na vida desta, da família e do bebê.
Os principais sintomas da DPP é o desinteresse para o mundo externo, humor deprimido, baixo autoestima, irritabilidade, choro frequente, agitação ou falta de energia para as atividades recorrentes do dia a dia, insônia ou sonolência, falta de concentração e dificuldade de pensar e organizar os pensamentos, alimentação compulsiva ou perda do apetite, desesperança, desamparo, sensação de incapacidade e de não dar conta do bebê, pensamentos de morte, sentimento de culpa e inutilidade e também manifestações psicossomáticas como dor de cabeça, pressão alta, hemorragia, infecções e dificuldade na amamentação.
Vivemos hoje uma cultura de alta performance materna tendo diversas orientações e cobranças sob o maternar. Precisando estimular, estar presente e ensinar constantemente, participar de todos os momentos. É uma pressão enorme para as mães/pais, que tentam equilibrar papeis, casamento, profissão.
E quais os efeitos disso no meio social? Começamos a julgar os pais, passamos pela rua ou em nosso meio analisando/observando e logo julgamos condutas parentais que não aprovamos, e a maternidade acaba sendo cada vez mais vigiada. Sendo levada a um caráter inatingível, porque não estaremos todos os momentos amorosos, afetuosos e positivos. E tudo que acaba acontecendo com os bebês/crianças, é direcionado como culpa materna, já que idealizamos a mãe perfeita.
Precisamos validar que somente na vivencia concreta com a maternidade que vão surgir particularidades, como o estilo da maternagem, quais as dificuldades e facilidades de cada um. E que não há uma via de regra ou manuais, mas sim o que posso e desejo ser para este dentro das minhas condições e realidade.
E que podemos sim procurar por ajuda profissional. Até porque não cuidamos de ninguém se nos descuidamos, e a saúde mental materna importa.
Se você é puérpera quero lhe fazer um convite, pare por um momento e responda com sinceridade o questionário da Escala de Depressão Pós Parto de Edimburgo, ele é autoaplicável e ao final você mesma pode somar os pontos, seguindo as instruções do mesmo, percebendo que seu resultado é superior a 10, oriento que procure por ajuda profissional, para compreender o que está acontecendo.
Na Unidade Básica de Saúde você pode solicitar por atendimento psicológico e caso seja necessário este lhe encaminhará para uma avaliação psiquiatrica, ou se conseguir a consulta com este, ele pode lhe encaminhar a terapia. Existem profissionais e plataformas que realizam atendimentos de forma online, com valores sociais, além de paróquias que também tem projetos em atendimento psicológico com valor social, não deixe de procurar por ajuda profissional acredite esse cuidado fará uma enorme diferença em sua vida, e também me coloco a disposição.
Lembre-se SAÚDE MENTAL MATERNA IMPORTA.
Bjos,
Com carinho,
Bruna Fabre Dantas
Psicóloga Perinatal e Clínica.
CRP 08/22545
Insta @brunadantaspsi
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