Desde a graduação em Psicologia ouvimos sobre a importância do envolvimento de pais no acompanhamento dos seus filhos, mas sempre seguida da ressalva, “pais não querem e nem podem ser terapeutas”. Ambas as afirmações sempre me acompanharam, até conhecer mais e mais abordagens que envolviam treinamento de pais e conhecer principalmente mães completamente imersas, tanto nas intervenções, quanto na educação dos seus filhos com TEA. Assim, abordamos aqui a relevância do treinamento de pais como uma abordagem de intervenção em diversas áreas do desenvolvimento de habilidades de crianças e jovens autistas.
Tanto na literatura, quanto em conversas com pais, sempre vemos que muitos deles se afastam de diversas interações – brincadeiras, jogos, lições de casa, e até mesmo da comunicação alternativa – de seus filhos por não serem treinados e não se sentirem preparados. Como profissional da área, fui treinada em diversas abordagens. Pouco a pouco, descobri que, quanto mais instrumentalizava os pais com diferentes atividades e estratégias, e os familiarizava com as respostas (ou a ausência de retorno) dos seus filhos, mais esses pais sentiam que também podiam tentar estimulá-los. O mito de que “só o terapeuta sabe fazer” deve ser revisitado.
Atualmente, a nossa prática como profissional é guiada por evidências de estudos científicos que demonstram o que é eficaz. Internacionalmente, esse envolvimento e treinamento de pais é conhecido como uma classe de suportes chamados de Intervenções Implementadas por Pais (Parent Implemented Interventions). Trata-se de treiná-los, individualmente ou em grupos, para conduzir toda uma intervenção proposta ou apenas uma parte da mesma. Os estudos descrevem que podem ser eficazes para estimular crianças ainda muito pequenas – desde antes dos dois anos de idade até por volta dos 11 anos. Porém, mais pesquisas vem sendo realizadas e expandindo tal idade. Os avanços provocados pela mediação dos pais incluem o desenvolvimento de habilidades sociais, cognitivas, acadêmicas, adaptativas e de comunicação, além de melhora no comportamento, na atenção compartilhada, no brincar e em habilidades pré-escolares. Aponta-se então, para esse importante nicho de intervenções em que se instrui pais a assumirem seu papel de estimular habilidades e complementar o suporte interventivo e educacional que uma criança com TEA recebe. A abordagem torna-se ainda mais relevante por possibilitar a expansão do dia de aprendizado, por criar oportunidades de treinamento em momentos íntimos de forma espontânea e por permitir a generalização das habilidades aprendidas.
Quando os pais aprendem não somente como interagir, mas como estimular e incentivar o desenvolvimento das habilidades de seus filhos, expandimos as possibilidades de aprendizado estruturado por mais horas diárias e em momentos de atividades do dia a dia. Mais horas de trabalho focado guiado pelos pais, apesar de não substituírem, diminuem a necessidade de um trabalho realizado exclusivamente por um especialista e reduzem, por consequência, o custo destas intervenções. Por fim, como os pais tendem a acompanhar os filhos em quase todos os ambientes, podem dar suporte ao treino de generalização das habilidades aprendidas em diversos contextos.
Em geral, para que um treino parental seja bem sucedido, alguns elementos devem estar presentes. A literatura define que, primeiramente, o profissional deve definir para os pais a estratégia que deve ser aprendida naquela sessão. Essa explicação verbal e com exemplos é o primeiro encontro dos pais com a habilidade ou atividade a ser treinada. Em seguida, o treinador modela a estratégia junto à criança ou jovem. Observar o profissional em ação é essencial, não somente ouvir ele falar sobre a estratégia. O próximo passo é o próprio pai aplicar a estratégia, pois assim consegue sentir as possibilidades e dificuldades de se colocar nesse papel. Por último, ele recebe um retorno sobre como foi esta aplicação. Este é o momento do treinador reconhecer as habilidades dos pais, que podem entender como melhorar.
Outro aspecto importante do treinamento de pais é que o profissional também ofereça exemplos de como eles podem treinar a estratégia para o desenvolvimento das diferentes habilidades dentro de casa. É importante dar exemplos concretos, que fazem parte da realidade daquela família, e explicar como as atividades podem ser aplicadas no contexto familiar e social. Enfim, os pais devem ser incluídos nas intervenções e treinados para que ampliem as possibilidades de desenvolvimento de diversas habilidades. O envolvimento potencializa os ganhos da criança e do jovem com TEA. Além de melhorar a relação familiar, instrumentaliza os pais a saberem como estimular, brincar e interagir com seus filhos em diversos contextos.
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