Muita gente relaciona o autismo com indivíduos tímidos e com grande capacidade intelectual. Essa imagem é provavelmente baseada em filmes como Rain Man e séries como The Good Doctor, em que o autista é retratado como um gênio que tem dificuldades de socializar. Mas até onde esse pensamento é correto?
De acordo com o DSM-5, manual que é a referência mundial para diagnósticos de transtornos mentais, uma pessoa no espectro autista é caracterizada por dois sintomas principais: déficits persistentes na comunicação e na interação social, e padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades.
Então o que é visto como “timidez” se trata de uma dificuldade de interação social. E a genialidade? Na verdade, a “grande capacidade intelectual” não é um traço característico do TEA, mas sim uma condição diferente e rara, conhecida como savantismo ou Síndrome de Savant.
Mesmo visto como gênios, os savants na verdade são pessoas com baixa inteligência, com QIs que costumam ficar entre 40 e 70 (como comparação, o QI médio de pessoas típicas fica entre 90 e 109). Contrastando com as suas limitações, os savants têm algumas habilidades excepcionais, sempre aliadas a uma memória fora do comum. Algumas das capacidades acentuadas são a memorização (como horários e dicionários), cálculos (fazer cálculos matemáticos complexos sem utilizar papel e em poucos segundos), habilidade musical (reproduzir qualquer música depois de escutar apenas uma vez), habilidade artística (grande habilidade para pintar ou esculpir) e linguagem (compreender e falar muitos idiomas). Pesquisas mostram que cerca de 10% das pessoas com autismo também apresentam algum grau de savantismo.
O caso mais famoso de autista savant é do americano Kim Peek, que foi a inspiração para o filme Rain Man. Ele tinha sérias limitações, dependendo de ajuda para atividades simples como se vestir, mas ao longo da vida leu e memorizou mais de 6.000 livros. Era capaz de identificar em segundos o dia da semana de qualquer data, além de ter decorado as informações de rodovias, códigos de CEP e DDD e as estações de TV locais de todas as cidades e condados americanos. Ele morreu aos 58 anos, em 2009, de um infarto.
O primeiro registro do Savantismo é do século XVIII, quando o psiquiatra americano Benjamin Rush descreveu a habilidade incrível de Thomas Fuller para números e cálculos. Mais tarde, o médico inglês John Langdon Down usou o termo idiot savant (idiota prodígio, numa tradução livre) para denominar o distúrbio. Na época, a palavra “idiota” era um termo científico usado para denominar pessoas com QI muito baixo. Apenas nos anos 1980 o transtorno foi rebatizado de Síndrome de Savant, aposentando a expressão que até então havia ganho um tom pejorativo.
A síndrome é muito rara e um estudo da Universidade do Wisconsin prevê que existam menos de 100 indivíduos savants vivos hoje no mundo. A maioria dos casos aparece na infância (mas há alguns registros de desenvolvimento tardio) e, assim como no espectro autista, os homens são mais suscetíveis que as mulheres.
Além da associação com o TEA, o savantismo é comum em pessoas com outros tipos de distúrbios mentais e também em casos de pacientes que sofreram lesões cerebrais. A capacidade de memorização altamente desenvolvida dos savants muitas vezes pode ser confundida com o interesse restrito do autista, mas existe uma diferença clara: o foco intenso do TEA exige um estudo por parte do indivíduo, enquanto a memória do savant é como um dom inato. Psiquiatras que fazem parte do Programa de Transtorno do Espectro Autista do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas descrevem a diferença entre autismo e síndrome de Savant da seguinte forma: um músico autista pode, por exemplo, ter grande interesse em Mozart e saber tocar todas as peças, explicando como foram criadas, como devem ser tocadas e etc. Por outro lado, um músico savant, mesmo sem ter estudado, consegue tocar uma sinfonia após escutá-la uma única vez.
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