Como o autismo se manifesta então entre irmãos gêmeos?

Gêmeos são aqueles irmãos gerados em uma mesma gestação e que, portanto, possuem exatamente a mesma idade. Podemos classificá-los em dois tipos, monozigóticos e dizigóticos.

É comum algumas pessoas estranharem ao se depararem com irmãos gêmeos que são esteticamente diferentes entre si. Esses são os chamados gêmeos dizigóticos. Eles são gerados a partir de dois óvulos e de dois espermatozoides diferentes, que crescem ao mesmo tempo, dividindo o espaço do útero da mãe. As diferenças ou semelhanças na genética deles são como as de qualquer outro irmão de outra idade. Os gêmeos dizigóticos podem ser do mesmo sexo ou não. Um indivíduo do sexo masculino e um do sexo feminino podem ser gêmeos

Já os gêmeos monozigóticos são aqueles pares de irmãos idênticos, aparentemente iguais em tudo. Esses dois indivíduos são originados a partir de um mesmo óvulo e um mesmo espermatozóide durante o processo de fecundação. Uma mesma célula dá origem aos dois, que nascem, portanto, com o mesmo sexo e com código genético muito semelhante. Entretanto, não é apenas a genética que determina as características de uma pessoa, mas o chamado fenótipo, a interação entre genética e ambiente, que vai se manifestar em cada um dos indivíduos.

As primeiras pesquisas em busca de explicações genéticas para as causas do Transtorno do Espectro Autista (TEA) remetem à década de 1970, com estudos baseados nas observações de gêmeos. Em 1977, um estudo com irmãos gêmeos demonstrou que em monozigóticos a concordância para o autismo variava de 36% a 92% – em contraste com gêmeos dizigóticos, onde a concordância era bem baixa.

Em 2014, a JAMA, uma renomada revista internacional da área da medicina, publicou um artigo sobre o risco familiar do autismo. Nessa pesquisa, pretendia-se analisar o quanto a genética interferia nas causas do transtorno. Para o estudo, também foram realizadas comparações entre irmãos gêmeos.

O resultado apontou que a probabilidade de um diagnóstico de TEA aos 20 anos de idade é de 59,2% para gêmeos monozigóticos, 12,9% para gêmeos dizigóticos.

Ou seja, a cada 100 pares de irmãos gêmeos monozigóticos, em cerca de 60 deles os dois irmãos terão autismo e, a cada 100 pares de gêmeos dizigóticos, em cerca de 13 os dois terão autismo.

Já dados divulgados no Brasil em 2011 mostraram um resultado de 10% de diagnóstico de autismo entre irmãos que não são gêmeos. Esse número também se assemelhou com o da revista JAMA de 2014, que foi por volta de 12%. Lembrando que a ideia de genética para gêmeos dizigóticos e para irmãos que não são gêmeos segue a mesma lógica.

Há, portanto, casos de gêmeos idênticos em que apenas um tem TEA. Essa diferenciação se dá por conta da combinação entre genética e ambiente. Outras pesquisas tentaram detectar quais fatores ambientais influenciam a ocorrência do transtorno.

Um relato de caso divulgado no Brasil em 2016, por exemplo, mostrou dois irmãos gêmeos dizigóticos (ou seja, não idênticos) diagnosticados com TEA. No momento da concepção das crianças, os pais apresentavam idade avançada e as condições da gravidez e do parto foram de risco. Ambas as situações atingiram os dois irmãos e foram descritas como possíveis fatores geradores do transtorno.

Em 2017, classificou-se fatores ambientais que podem ter uma grande chance de influenciar a genética e, por consequência, o diagnóstico de TEA. Pesquisas analisaram gêmeos idênticos em que apenas um deles possuía o transtorno e buscou explorar quais fatores se diferenciavam na vida de cada um. Assim, foi indicado que pode haver influência do que se chama de eventos médicos precoces e também de fatores ambientais não compartilhados pelos irmãos

Entre os eventos médicos adversos precoces podemos listar angústia fetal, fatores neonatais como hipoglicemia, falta de ferro, baixa quantidade de plaquetas no sangue e também peso ao nascer, microcefalia, infecções frequentes (como as de ouvido), infecção nos rins antes dos 2 anos, além de condições médicas graves do primeiro ano, como hemorragia cerebral e hidrocefalia e malformações congênitas do coração. Já entre os fatores ambientais não compartilhados estão especialmente as desregulações durante o primeiro ano de vida, incluindo problemas de alimentação e sono, além de choro excessivo e preocupação.

Pesquisas de 2019 também analisaram as variáveis ambientais. As evidências relacionaram uma maior vulnerabilidade dos filhos ao TEA a uma série de fatores, como idade materna e paterna avançada, exposição a substâncias tóxicas, diabetes materna e uso de remédios para depressão, entre outros. Além disso, o estudo confirmou que não há nenhuma evidência de que a vacinação influencie o risco de autismo.

Dessa forma, vemos que existe, sim, a possibilidade de, mesmo entre gêmeos idênticos, um deles ter transtorno do espectro autista e o outro, não. Estudos mostram cada vez mais que há uma grande influência da carga genética na origem do TEA, mas os estudos sobre gêmeos indicam que a influência ambiental também é crucial. Entretanto, ainda é necessário que muitas pesquisas sejam realizadas para compreender com mais certeza quais genes influenciam, em conjunto, o desenvolvimento do TEA, assim como quais fatores ambientais são determinantes para que uma pessoa seja autista e outra, não.


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